Como me Julgam!

Quantas pessoas acham que por trabalhar em casa, numa empresa familiar (do meu marido) e no meu próprio negócio de artesanato e este blog, por me verem a sair de casa algumas vezes ou a postar coisas em “suposto horário de trabalho”, presumem que EU NÃO TRABALHO A SÉRIO! Sim, letras garrafais de quem quase grita, furiosa e injustiçada. As pessoas têm alguma coisa a ver com a minha vida? Não! Devo justificação do que faço a alguém? Também não! Mas vivemos em sociedade, vivo na minha pequena comunidade de família e amigos e não é fixe perceber que me olham e que falam como se eu tivesse a vida facilitada e não desse no duro (seja lá o que isso for, na cabeça de cada um!)

Vamos lá do princípio para enquadrar. Quando em março de 2020 nos deparamos com confinamento, eu trabalhava como comercial e formadora numa empresa, por conta de outrem. Comercial a tempo inteiro e esporadicamente também dava formação em horas extra. Eu e o meu marido Tiago como quase toda a gente ficamos a trabalhar em casa durante o confinamento e os dois constantemente em chamadas telefónicas, reuniões no zoom, etc. Isto numa altura em que o Daniel tinha 2 anos e 8 meses, que de repente deixa de ter a sua rotina no colégio e que exigia de nós toda a atenção. Não sabíamos nesta altura que era autista e que tinha phda (hiperatividade e défice de atenção). Mesmo sem esse conhecimento, pela sua idade e características associadas, obviamente começou a ser difícil cumprir 8h diárias de trabalho em chamadas para clientes e reuniões com a equipa e com a entrega/cuidados que eu tinha de ter com o Daniel. Além disto, tínhamos a minha mãe a viver connosco e a passar uma situação de saúde debilitada e a precisar da minha atenção e ajuda. Em maio, dois meses depois do início do confinamento eu estava estourada, stressada, sem conseguir dar conta de tudo o que tinha em mãos para lidar e sentia-me a entrar num esgotamento. Só eu saía de casa para levar a minha mãe onde era preciso e aproveitava para fazer compras, cozinhava todas as refeições para os 4, etc. O meu marido tinha o seu trabalho de 8h diárias e o nosso negócio pessoal de vendas online disparou, o que foi bom para nós, claro, mas que o ocupava constantemente. Dada a conjuntura, decidimos que eu me despediria imediatamente e passaria a trabalhar para a nossa empresa, para o ajudar pois não conseguia sozinho e assim geria melhor o tempo com as tarefas que tinha para fazer e com menos pressão, até porque não me exigia estar em chamadas e reuniões. É um trabalho mais administrativo e que vou gerindo.

Foi até esta nova forma de trabalhar e ter um pouco mais de tempo para o nosso filho, que me permitiu começar a perceber o seu comportamento e características que me fizeram depois procurar respostas e nos levaram ao seu diagnóstico.

A minha mãe voltou saudável para a sua vida normal, o colégio reabriu e o Daniel começou a ter terapias, várias terapias. Chegou a fazer 4 terapias diferentes durante a semana, em 2 sítios distintos, 3 ou 4 tardes por semana. Portanto nessas tardes eu não conseguia trabalhar. Além de estarmos a pagar todas as terapias do nosso bolso (só recentemente o Daniel tem direito a um pequeníssimo subsídio para ajudar), eu não conseguia rentabilizar o meu tempo. Para não falar em despesas de deslocação, consultas de pediatria de Desenvolvimento, exames, etc.

E ainda assim me dizem que sou uma sortuda porque faço do meu tempo o que quero, posso passar o dia sem fazer nada ou a passear ou outras barbaridades do género. Vou sorrindo e respondo ironicamente para não responder torto ou entrar em explicações da minha vida. Mas é cansativo ser mal julgada, ainda por cima quando estou estourada, sempre a correr dum lado para o outro para poder conseguir fazer tudo e ouvir este tipo de comentários. Não trocaria o meu filho, a minha família por nada, mas se às vezes soubessem as saudades de um dia de trabalho dito “normal”, jamais se atreveriam a julgar!!

Neste momento desde janeiro deste ano 2024 iniciei este blog como meu projeto, para escrever o que vai na alma, partilhar o que vivo e sinto e com isso pode ser que alguém se reveja, identifique e que essa pessoa perceba que não está só porque passo algo similar. Às vezes sentimo-nos sozinhos, achamos que ninguém passa pelo mesmo e que somos uns extraterrestres e não é assim. Estamos no mesmo barco. Ou em barcos similares, no mesmo mar e só não nos vemos porque parece mal hoje em dia comunicar o que sentimos e vivemos e então nem olhamos uns para os outros ou temos vergonha que olhem para nós, às vezes mais frágeis e vulneráveis como se fosse ridículo estarmos assim. Temos de ser fortes sempre, não?! Era o que mais faltava.

Comecei agora recentemente um negócio de venda de artesanato, Jesmonite, algo que jamais pensei fazer na minha vida, mas que me está a dar gosto fazer. Criar com as minhas mãos, usar a imaginação, num projeto meu. Quero que o Sopro da Minha Alma este projeto seja isso mesmo, o meu sopro, aquilo que me faz sentido viver e respirar em determinado momento da vida. E se amanhã for ser cabeleireira ou cozinheira, pois serei. Eu tenho é de ser feliz a fazer o que faço, tenho de me identificar e no meu caso, conseguir encaixar com as 3 terapias que o Daniel faz no momento, mais a sua natação, afazeres domésticos e o apoio que dou ao meu marido no nosso negócio, na nossa empresa. Agora virem dizer que não faço nada porque posso gerir os meus horários, deixa-me mesmo triste, magoada e sem entender porque é que o fazem. É verdade que posso se calhar almoçar com uma amiga e até devia fazer mais vezes para bem da minha sanidade mental, ou fazer as camas a meio da manhã, estender roupa na hora de almoço… É verdade que dentro dos horários obrigatórios do meu filho com a escola e terapias, posso organizar-me à minha maneira. Gostava de ver muita gente fazer tudo o que faço no tempo que tenho e ainda assim ouvir o que tantas vezes ouço. É muito perigoso julgar os outros porque parece que têm mais tempo livre. Ninguém paga as minha contas por mim, não me vêm a trabalhar ao fim-de-semana ou noites se preciso, nem o esforço para conseguir gerir tanta coisa num só dia. E ainda assim se tirar tempo para dar um passeio, meditar 10 minutos no jardim e postar uma foto a fazê-lo, não julguem, nunca julguem.

Menos julgamento, menos bocas sobre a forma como os outros vivem e mais compreensão e apoio. Por um lado, parece que às vezes invejam a minha vida de “não fazer nada” e talvez por isso mesmo tentam diminuir com boquinhas e maldizeres. Ainda esta semana me disseram numa conversa “sim, sim, realmente tens mesmo ar de cansada! Pffff” em tom de gozo porque devem achar que passo o dia em spa. Se tenho boa cara é porque tento ser bem disposta, não me queixar porque não me resolve as questões, porque sou feliz na minha vida e se não sou mudo o rumo e busco a minha felicidade. Se tenho boa cara é porque me obrigo a fazer exercício às 7h da manhã porque sei que me faz bem para mobilidade e para descarregar stress. Se ando com boa cara, é porque me deito logo a seguir a deitar o meu filho, portanto cedo e vou para a cama escrever, ler, acender uma vela e respirar fundo. Se tenho boa cara e pareço feliz é porque faço por isso.

E também se fosse rica e não precisasse trabalhar, ninguém tinha nada a ver com isso. Se eu passasse o dia na praia, ninguém tinha nada a ver com isso. A minha vida não tem de incomodar ninguém, nem a forma como giro o meu tempo, como decido aproveitar os momentos e quando os faço. Se cada um se ocupasse mais com a sua vida se calhar seria bem mais feliz e se querem ter alguma coisa com a vida dos outros, é fazê-lo de forma positiva, perguntando o que precisam e como precisam.

Isto é efetivamente um desabafo que ponderei bastante se colocava aqui no blog, mas sei que muitas pessoas, principalmente mães atípicas, mães com negócio próprio se vão identificar.

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