Sinto que com a idade cada vez mais gosto das minhas rotinas, do sossego do lar, da tranquilidade de fazer as coisas com mais tempo e gosto de sítios que me são familiares. Adoro estar em casa, não só a trabalhar, na vida familiar do dia-a-dia, mas também receber a família e amigos. Gosto muito de estar com pessoas, contudo nem sempre me apetece agora muita confusão e barulho. E mesmo que esteja num ambiente desses e com certeza que muito feliz pelo momento, rapidamente depois necessito de me recolher e de tranquilidade para me restabelecer a todos os níveis.
Noto também que fico desorientada e até irritada sempre que alguém me desorganiza o dia ou algo que não controlo aparece e tenho de mudar os meus planos repentinamente. Principalmente durante a semana, em que o tempo é mais apertado com as obrigações domésticas, de trabalho, das terapias do D. e de o acompanhar e orientar nos trabalhos de casa, etc. Com a limitação temporal nestes dias, fico mesmo fora de mim se a estrutura que tenho é abalada. Gosto de previsão, gosto de sentir que controlo algumas coisas da minha vida. E está tudo bem assim. Eu vivo bem e feliz com isso, não sinto que seja demasiado rígida e intolerante, somente gosto de estar calma e tranquila e para isso preciso desta organização, preciso da minha rotina. Organização para mim é essencial!
Respeito quem viva de outra forma, tal como gosto que respeitem a minha. Ás vezes ouço “bocas” por ter esta forma de viver, sendo que como eu vivo o meu dia a dia, não tem de incomodar ninguém. Todos nós devemos estar na vida como nos sentimos mais felizes e tranquilos. Dizem-me às vezes que sou demasiado controladora e que a vida não pode ser levada assim pois é muito impermanente, como se eu não tivesse já vivido o suficiente para entender isso. Aliás, exatamente porque a vida é imprevisível, as pessoas são imprevisíveis, é que gosto de gerir o meu tempo e vida da forma que gosto, sempre que é possível. Até para quando vierem esses abalos incontroláveis que a vida nos apresenta, eu esteja ainda assim no meu melhor e equilibrada. Isso mesmo, equilíbrio! A vida deve ser na minha opinião um equilíbrio de situações e vivências. Como diz o velho ditado “nem tanto ao mar, nem tanto à terra”.
E talvez para equilibrar este lado mais organizado e previsível, existe em mim um lado aventureiro, mais desprendido e que gosta de sair da zona de conforto. Acho até necessário de tempos a tempos sair da minha zona, quando percebo que já não estou a evoluir, que estou demasiado estagnada, aborrecida… E isto surge de uma forma natural, é engraçado até. E pode ser em áreas muito diferentes, ou seja, pode ser uma viagem a um sítio completamente diferente do que estou habituada, pode ser um novo hobbie, pode ser um curso de algo que jamais teria pensado fazer. Sei que cresço e aprendo muito mais, quando estou fora da minha área, daquilo que já conheço e dou como garantido. E o que me tem acontecido quando me permito viver estas novas experiências pode ser muito díspar. Tanto fico feliz porque vou conseguir aplicar na minha rotina algo novo, ou conheci pessoas que passaram a fazer parte da minha vida e que me acrescentam muito ou até tenho novos conhecimentos de uma área que posso aplicar no meu trabalho. Como também acontece de essa nova experiência ser menos boa e dou então até mais valor ao que já tenho, a quem tenho e à forma como sou e estou na vida.
Seja como for, todos nós só aprendemos se experienciarmos, se vivenciarmos. Ficar quietos no mesmo sítio a fazer sempre as mesmas coisas, claro que é confortável e bom, a rotina é importante pra nos dar estabilidade, equilíbrio, segurança, mas devemos pôr-nos à prova de vez em quando, para irmos buscar mais conhecimento e crescimento pessoal. Sou assim esta dualidade entre a calma do lar, o conforto do conhecido e previsível e a imprevisibilidade de uma saída repentina ou a alegria e confusão de uma festa.
Recentemente saí da zona de conforto em diferentes situações e áreas da minha vida. Fui ao retiro que tanto mexeu comigo, tirei um curso na área de artesanato que jamais imaginei na minha vida fazer e fui viajar com a minha família e amigos para Marrocos, uma realidade bem diferente da nossa. Nesta última aventura senti-me peixe fora de água por vários motivos em diferentes situações. Para o D. foi uma experiência enriquecedora e um desafio muito grande dentro das suas características do autismo e do PHDA. Sinto que todos saímos a ganhar e que tudo foi ultrapassado da melhor forma, principalmente o nosso filho. Falarei sobre a viagem e estes nossos desafios num próximo texto.
Em relação ao artesanato, estou a pôr em prática o que aprendi e quem sabe lançarei para o mundo brevemente as peças feitas por mim e ver no que dá. Está-me a dar muito prazer sem dúvida e estou a fazer algo completamente diferente de tudo o que já fiz na vida. É maravilhosa a sensação e entusiasmo do novo, desafiante e tão compensador por me sentir realizada e feliz ao fazê-lo.
O retiro ainda ressoa em mim, ainda está aqui a fazer o seu trabalho e a ajudar a andar por estas zonas menos conhecidas, acreditando que sou capaz.
E tu, costumas sair da tua zona de conforto? Deixa aqui a tua opinião se sentires, para eu também saber um pouco de ti. Obrigada por me leres e acompanhares.