É muito comum os pais no geral, principalmente as mães, deixarem de se cuidar, de olhar para si mesmo. Com pais atípicos acontece provavelmente ainda mais, têm de despender mais do seu tempo para cuidar da sua criança, pois têm de a acompanhar a muitas terapias, médicos, fazer exames, reavaliações, etc. Têm ou devem ter tempo para em casa continuar a trabalhar, a desenvolver atividades que muitas vezes são indicadas pelos terapeutas para complementar o que é feito em sessão ou somente porque a criança desregulou e precisa de mais atenção, por exemplo. E se qualquer criança pode ter os seus desafios normais do crescimento e fases do seu desenvolvimento, garanto que crianças com Perturbação do Espectro de Autismo (PEA) e com outras comorbidades normalmente associadas, como é o nosso caso em que o D. também tem Perturbação de Hiperatividade e Défice de Atenção (PHDA), são muito mais as exigências que se vivem.
É importante lembrar que criar filhos não deve ser uma tarefa exaustiva e irritante o tempo todo. Na verdade, é possível encontrar prazer nessa experiência, aproveitando os momentos de conexão, aprendizagem e crescimento compartilhados com as crianças. Valorizar a leveza na educação dos filhos pode contribuir para um ambiente familiar mais harmonioso e estimulante. Contudo, culturalmente, ainda existe um discurso de que os pais e, mais uma vez principalmente as mães, têm que se dedicar exclusivamente aos filhos, que as crianças devem ser sempre prioridade absoluta. Então, quando fazemos algo por nós próprios como deixar os filhos com a avó para ir ao cinema numa sexta à noite, muitas vezes apelidam-nos rapidamente de egoístas: “Como assim, deixar o filho para se ir divertir?” Mas ser egoísta não é necessariamente algo mau, pelo contrário. Temos de tirar o rótulo negativo da palavra egoísmo. Ser egoísta nada mais é do que colocarmo-nos em primeiro lugar. Quando uma pessoa se coloca em primeiro lugar, ela está a cuidar da vida dela. Ela ama-se, trata-se bem, tem energia para tomar conta da sua própria vida e também para cuidar do próximo.
Cada vez mais existem pessoas com depressões, burnout´s e afins por não se priorizarem. Cuidar de nós a nível físico, mental, intelectual, espiritual, social e até profissional é necessário, não é luxo. Então pais tomem consciência desta questão, tentem perceber o que estão ou não a fazer por vocês, analisem com calma, em amor e sem julgamento. E se entenderem que realmente vos faltar autocuidado, amor próprio, self time, ponham mãos à obra e comecem a cuidar de vós.
Não tem de ser algo radical e querer fazer um monte de coisas ao mesmo tempo tipo resolução de ano novo, pois isso dura uma ou duas semanas e acabamos por desistir. Cada um tem de perceber o que gosta mais e se enquadra no seu tipo de vida. Sem a desculpa de “não tenho tempo”, pois quase todos arranjamos se quisermos um tempinho no nosso dia. Quem quer faz, quem não quer arranja desculpas! Perdoem-me a dureza das palavras, mas é mesmo assim e também serve para mim. Comecem então por algo simples, pode até demorar só 5 ou 10 minutos diariamente e para isso pode ser feito ao acordar um pouco mais cedo, ou no momento de deitar. As opções são imensas como: ler, pintar, desenhar, correr, ginásio ou exercício em casa, meditar, escrever o que sente, dar um passeio, dançar com a música preferida sem medo de julgamento porque ninguém está a ver… Há tanto que se pode fazer e podemos até ir variando algumas dessas escolhas para não ser repetitivo ou monótono. Há quem prefira como um ritual e como forma de rotina fazer sempre a mesma coisa como meditar logo pela manhã (10 minutos basta) que ajuda muito a mente a estar calma, focada, a ter os pensamentos e a respiração mais controlados. Ou fazê-lo à noite antes de deitar para acalmar os pensamentos e preocupações que teimam em aparecer em catadupa. Por outro lado, há pessoas que vão alternando entre uma meditação, uns alongamentos matinais, um passeio, ler ou ouvir um podcast enquanto toma o pequeno almoço, ainda na calma para o dia começar tranquilo. Existem também aulas de 10, 12, 15 minutos, no youtube, de cardio, yoga ou pilates para quem prefere “despertar” também o corpo com algum movimento e depois do banho se sente revigorado, com calma, mas cheio de energia para o dia.
Como disse, a experiência que tenho e o que vejo à minha volta é que atitudes intempestivas de repentinamente querer alterar toda a rotina, alimentação, hábitos, dura pouco tempo. Precisamos de tempo e habituação até passar a ser algo normal no nosso quotidiano e aí podemos acrescentar ou modificar outro aspeto da vida.
Segundo alguns estudos nos dizem, levamos cerca de 21 dias para formarmos um novo hábito. Contudo, a verdade é que o tempo necessário para adquirir um novo hábito pode variar bastante dependendo do comportamento em questão e da pessoa.
Um estudo publicado no European Journal of Social Psychology descobriu que o tempo médio para formar um novo hábito foi de 66 dias. Os participantes do estudo foram convidados a realizar um comportamento novo diariamente durante esse período, e depois os investigadores analisaram quanto tempo levou para que o comportamento se tornasse automático.
Outro estudo descobriu que o tempo para formar um novo hábito pode variar de 18 a 254 dias. A diferença deve-se em parte à complexidade do comportamento em questão. Comportamentos simples, como beber mais água, podem ser aprendidos mais rapidamente, enquanto comportamentos mais complexos, como fazer exercícios regularmente, podem levar mais tempo. Em relação ao exercício físico no meu caso particular, acho que demorei cerca de 4 meses, portanto 120 dias mais ou menos, até perceber que já estava criado esse hábito e o fazia naturalmente e com prazer. Claro que nem todos os dias que faço vou com a mesma vontade, tem dias que me apetece desistir ou não fazer e aí entra a consistência, o foco no que é importante e não desisto. Falarei mais dos meus hábitos no próximo texto, como é que mudei algumas coisas na minha vida, para cuidar de mim e espero que ajude.
É importante lembrar que formar um novo hábito requer dedicação e consistência. Claro que é preciso fazer um esforço consciente para adotar o novo comportamento e lembrar de fazê-lo regularmente. Com o tempo, torna-se então mais fácil e natural.
Se cuidarmos de nós seremos capazes de lidar com as responsabilidades diárias e com as tensões, que inevitavelmente aparecem, de uma forma mais amorosa e cheia de energia.
Cuidem-se por vocês e para poderem cuidar dos vossos!